quarta-feira, 4 de abril de 2012

Distância

 Não vás para tão longe!
Vem sentar-te aqui
 na chaise-longue ao pé de mim...
Tenho o desejo doido de contar-te
Estas saudades que não tinham fim.

Não vás para tão longe
Quero ver se ainda sabes olhar-me
 como d'antes e se nas tuas mãos acariciantes
Inda existe o perfume de que eu gosto.

Não vás para tão longe!
Tenho medo do silêncio pesado d'esta sala...
Como soluça o vento no arvoredo!
E a tua voz, amor, como se cala!

Não vás para tão longe!
Antigamente, era sempre demais o curto espaço
Que havia entre nós dois...
Agora, um embaraço, hesitas e depois
Com um gesto de tédio e de cansaço,
Achas inconveniente o meu abraço.

Não vás para tão longe!
Fica. Inda é tão cedo!
O vento continua a fustigar
Os ramos sofredores do arvoredo,
E eu ponho-me a pensar
E tenho medo!

Não vás para tão longe!
Na sombra impenetrada
Como se agita e se debate o vento!...
Paira nas velhas ruínas do convento
que além se avista
A alma melancólica d'um monge
Que a vida arremessou àquela crista...

Céu apagado, negro, pessimista
E tu sempre mais longe!...

[Fernanda de Castro]


Pintura a óleo de Anita Malfatti
(Fernanda de Castro. 1922)

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