quarta-feira, 5 de março de 2008

O Teu Riso (Neruda)


O teu riso

Tira-me o pão, se quiseres,
tira-me o ar, mas não
me tires o teu riso.

Não me tires a rosa,
a lança que desfolhas,
a água que de súbito
brota da tua alegria,
a repentina onda
de prata que em ti nasce.

A minha luta é dura e regresso
com os olhos cansados
às vezes por ver
que a terra não muda,
mas ao entrar teu riso
sobe ao céu a procurar-me
e abre-me todas
as portas da vida.

Meu amor, nos momentos
mais escuros solta
o teu riso e se de súbito
vires que o meu sangue mancha
as pedras da rua,
ri, porque o teu riso
será para as minhas mãos
como uma espada fresca.

À beira do mar, no outono,
teu riso deve erguer
sua cascata de espuma,
e na primavera, amor,
quero teu riso como
a flor que esperava,
a flor azul, a rosa
da minha pátria sonora
Ri-te da noite,
do dia, da lua,
ri-te das ruas
tortas da ilha,
ri-te deste grosseiro
rapaz que te ama,
mas quando abro
os olhos e os fecho,
quando meus passos vão,
quando voltam meus passos,
nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria.

[Pablo Neruda]

2 comentários:

  1. Se toda a gente fosse como tu
    e tivesse o cheiro das madrugadas
    o mundo seria tecido a nu
    e as noite seriam bordadas

    Se toda a gente fosse como tu
    e sentisse o bater do teu coração
    nada seria tão cru
    e a vida seria uma canção

    Feito e dedicado a ti António. Bem hajas.

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  2. Fiquei muito feliz com a homenagem... vc é meu porto seguro, meu riso a cada manhã... obrigada...

    Meu Doce Lobo.

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