sábado, 11 de junho de 2011

fingir que está tudo bem

fingir que está tudo bem:
o corpo rasgado e vestido
com roupa passada a ferro
rastos de chamas dentro do corpo
 gritos desesperados sob as conversas:
 fingir que está tudo bem:
olhas-me e só tu sabes:
na rua, onde os nossos olhares
 se encontram é noite:
as pessoas não imaginam:
 são tão ridículas as pessoas
 tão desprezíveis:
 as pessoas falam e não imaginam:
 nós olhamo-nos:
fingir que está tudo bem:
 o sangue a ferver sob a pele
 igual aos dias antes de tudo
 tempestades de medo nos lábios a sorrir:
 será que vou morrer? pergunto
dentro de mim: será que vou morrer?
 olhas-me e só tu sabes: ferros em brasa
 fogo, silêncio e chuva que não se pode dizer:
amor e morte: fingir que está tudo bem:
 ter de sorrir: um oceano que nos queima
 um incêndio que nos afoga.

[José Luis Peixoto]

Sem comentários:

Enviar um comentário