segunda-feira, 4 de julho de 2011

Ode ao Tejo e à Memória de Álvaro de Campos

E aqui estou eu
ausente diante desta mesa
e ali fora o Tejo.
Entrei sem lhe dar um só olhar.
Passei, e não me lembrei de voltar a cabeça
e saudá-lo deste canto da praça:
"Olá, Tejo! Aqui estou eu outra vez!"
Não, não olhei.

Só depois que a sombra de Álvaro de Campos
 se sentou a meu lado me lembrei que estavas aí, Tejo.
Passei e não te vi.
Passei e vim fechar-me dentro das quatro paredes, Tejo!
Não veio nenhum criado dizer-me se era esta a mesa
em que Fernando Pessoa se sentava
contigo e os outros invisíveis à sua volta
inventando vidas que não queria ter.
Eles ignoram-no como eu te ignorei agora, Tejo.
Tudo são desconhecidos, tudo é ausência no mundo
tudo indiferença e falta de resposta.
Arrastas a tua massa enorme como um cortejo de glória
e mesmo eu que sou poeta passo a teu lado de olhos fechados
Tejo que não és da minha infância
mas que estás dentro de mim
 como uma presença indispensável
majestade sem par nos monumentos dos homens
imagem muito minha do eterno
porque és real e tens forma, vida, ímpeto
porque tens vida, sobretudo
meu Tejo sem corvetas nem memórias do passado...
Eu que me esqueci de te olhar!

[Adolfo Casais Monteiro]

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