sábado, 16 de julho de 2011

Um Rosto

Apenas uma coisa inteiramente transparente:
o céu e por baixo dele a linha obscura do horizonte
nos teus olhos, que pude ver ainda através de pálpebras
 semicerradas, pestanas húmidas da geada matinal
 uma névoa de palavras murmuradas num silêncio de hesitações.
Há quanto tempo, tudo isto? Abro o armário onde o tempo antigo
se enche de bolor e fungos, limpo os papéis
cartas que talvez nunca tenha lido até ao fim
 fotografias cuja cor desaparece, substituindo os corpos
por manchas vagas como aparições
 e sinto eu próprio, que uma parte da minha vida
 se apaga com esses restos.

[Nuno Júdice]

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