terça-feira, 16 de agosto de 2011

Despedida

Uma harpa envelhece.
Nada se ouve ao longo dos canais e os remadores
sonham junto às estátuas de treva.
A tua sombra está atrás da minha sombra e dança.
Tocas-me de tão longe, sobre a falésia
 e não sei se foi amor.
Certo rumor de cálices
 uma súplica ao dealbar das ruínas
tudo se perdeu no solitário campo dos céus.
Uma estrela caía.
Esse fogo consumido queima ainda
 a lembrança do sul, a sua extrema dor anoitecida.
Não vens jamais.
O teu rosto é a relva mutilada
 dos passos em que me entristeço
 a absoluta condenação.
Chove quando penso que um dia
 as tuas rosas floriam no centro desta cidade.
Não quis, à volta dos lábios  a profanação do jasmim
as tuas folhas de outubro.
Ocultarei, na agonia das casas, uma pena que esvoaça
a nudez de quem sangra à vista das catedrais.
O meu peito abriga as tuas sementes  e morre.
Esta música é quase o vento.

[José Agostinho Baptista]