sábado, 28 de janeiro de 2012

O poema

O poema levar-me-á no tempo
Quando eu já não for eu
E passarei sózinha
Entre as mãos de quem lê
O poema alguém o dirá às searas
A sua passagem se confundirá
Com o rumor do mar com o passar do vento
O poema habitará
O espaço mais concreto e mais atento
No ar claro nas tardes transparentes
As suas sílabas redondas
(Oh antigas oh longas
Eternas tardes lisas)
Mesmo que eu morra o poema encontrará
Uma praia onde quebrar as suas ondas
E entre quatro paredes densas
De funda e devorada solidão
Alguém seu próprio ser confundirá
Com o poema no tempo

[Sophia de Mello Breyner Andresen ]   

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