Foi-se tudo
como areia fina escoada pelos dedos.
Mãe! aqui me tens, metade de mim
sem saber que metade me pertence.
Aqui me tens, de gestos saqueados
onde resta a saudade de ti
e do teu mundo de medos.
Meus braços, vê-os, estão gastos
de pedir luz e de roubar distâncias.
Meus braços cruzados
em cruz de calvário dos meus degredos.
Ai que isto de correr pela vida,
dissipando a riqueza que me deste
de levar em cada beijo
a pureza que pariste e embalaste
ai mãe, só um louco ou um Messias
estendendo a face de justo
para os homens cuspirem o fel das veias
só um louco, ou um poeta ou um Cristo
poderá beijar as rosas que os espinhos sangram
e embora rasgado, beber o perfume
e continuar cantando.
Mãe! tu nunca previste as geadas e os bichos
roendo os campos adubados
e o vizinho largando a fúria dos rebanhos
pela flor menina dos meus prados.
E assim, geraste-me despido como as ervas
e não olhaste os pegos nem as cobras
verdes, viscosas, espreitando dos nichos.
De mão nua, entregaste-me ao destino.
Os anjos ficaram lá em cima, cobardes, ansiosos.
E sem elmos ou gibões,
nem lutei nem vivi:
fiquei quieto, absorto, em lágrimas
e lá ao fundo esperavam-me valados
e chacais rancorosos.
Mãe! aqui me tens,
restos de mim.
Guarda-me contigo agora,
que és tu a minha justiça e o exílio
do perdido e do achado.
Guarda-me contigo agora
e adormece-me as feridas
com as guitarras do fado.
Mas caberá no teu regaço
o fantasma do perdido?
[Fernando Namora]
Querida Mãe, faz hoje 3 anos que foste embora e tanta coisa que ficou por te dizer. Fica sempre, Mãe nunca avisa quando se vai embora. Lá tenho sobrevivido, não sei como, isto por aqui vai de mal a pior, contigo por aqui as coisas eram bem melhores, fazes-me tanta falta querida Mãe, Grande Amor da minha vida.
como areia fina escoada pelos dedos.
Mãe! aqui me tens, metade de mim
sem saber que metade me pertence.
Aqui me tens, de gestos saqueados
onde resta a saudade de ti
e do teu mundo de medos.
Meus braços, vê-os, estão gastos
de pedir luz e de roubar distâncias.
Meus braços cruzados
em cruz de calvário dos meus degredos.
Ai que isto de correr pela vida,
dissipando a riqueza que me deste
de levar em cada beijo
a pureza que pariste e embalaste
ai mãe, só um louco ou um Messias
estendendo a face de justo
para os homens cuspirem o fel das veias
só um louco, ou um poeta ou um Cristo
poderá beijar as rosas que os espinhos sangram
e embora rasgado, beber o perfume
e continuar cantando.
Mãe! tu nunca previste as geadas e os bichos
roendo os campos adubados
e o vizinho largando a fúria dos rebanhos
pela flor menina dos meus prados.
E assim, geraste-me despido como as ervas
e não olhaste os pegos nem as cobras
verdes, viscosas, espreitando dos nichos.
De mão nua, entregaste-me ao destino.
Os anjos ficaram lá em cima, cobardes, ansiosos.
E sem elmos ou gibões,
nem lutei nem vivi:
fiquei quieto, absorto, em lágrimas
e lá ao fundo esperavam-me valados
e chacais rancorosos.
Mãe! aqui me tens,
restos de mim.
Guarda-me contigo agora,
que és tu a minha justiça e o exílio
do perdido e do achado.
Guarda-me contigo agora
e adormece-me as feridas
com as guitarras do fado.
Mas caberá no teu regaço
o fantasma do perdido?
[Fernando Namora]
Querida Mãe, faz hoje 3 anos que foste embora e tanta coisa que ficou por te dizer. Fica sempre, Mãe nunca avisa quando se vai embora. Lá tenho sobrevivido, não sei como, isto por aqui vai de mal a pior, contigo por aqui as coisas eram bem melhores, fazes-me tanta falta querida Mãe, Grande Amor da minha vida.
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