terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

O Amor, Meu Amor

O nosso amor é impuro
como impura é a luz e a água
e tudo quanto nasce
e vive além do tempo.
As minhas pernas são água
as tuas são luz e dão a volta ao universo
quando se enlaçam
até se tornarem deserto e escuro.
E eu sofro de te abraçar
depois de te abraçar para não sofrer.
E toco-te
para deixares de ter corpo
e o meu corpo nasce
quando se extingue no teu.
E respiro em ti
para me sufocar
e espreito na tua claridade
para me cegar
meu Sol vertido em Lua,
minha noite alvorecida.
Tu  bebes-me
e eu converto-me na tua sede.
Os meus lábios mordem
Os meus dentes beijam
A minha pele veste-te
e ficas ainda mais despida.
Pudesse eu ser tu
E em tua saudade
 ser a minha própria espera.
 Mas eu deito-me no teu leito
Quando apenas queria dormir em ti.
E sonho-te
Quando ansiava ser um sonho teu.
E levito, voo de semente
para em mim mesmo te plantar
menos que flor: simples perfume,
lembrança de pétala sem chão onde tombar.
Os teus olhos inundando os meus
e a minha vida, já sem leito
vai galgando margens
até tudo ser mar.
Esse mar que só há depois do mar.

[Mia Couto]

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